
Há um bom tempo comecei a me apegar mais às minhas fotos com essa atmosfera magenta. O primeiro sinal foi nos últimos dias de 2018, quando consegui registrar um espetáculo absurdamente rosa nas ruas de Paraty e desde então essas e tantas outras fotos que havia feito anteriormente passaram a me prender no olhar.
O curioso é que nesta quarentena tenho escutado com uma certa frequência dois discos: “Verde, anil, amarelo, cor-de-rosa e carvão” da Marisa Monte – que mesmo possuindo 5 cores no nome, a cor da capa é rosa. E também Vagarosa da Céu, mesma paleta das cores do pôr do sol de gelatina de Paraty (aliás, esta expressão foi criada por mim nesse dia e não consigo me referir de outra forma). Vagarosa passou a ser a trilha sonora oficial dessa atmosfera.
Bubuia foi minha primeira música xodó. Descobri que no Amazonas significa estar à mercê das águas. “Subo o rio no contra-fluxo, à margem da loucura. Na fé que a vida após a morte, continua. Eu vou na bubuia, eu vou.”. E só depois disso percebi que todas as fotos rosa estavam a beira da água.
Os sinais vão se conectando, outras fotos da mesma paleta precisavam estar perto dessas, e meio sem querer, já tinha um novo conjunto fechado para fazer companhia ao silêncio e presença. Se chama Magenta e pode ser acessado aqui. Às vezes parece que os sinais vêm se apresentando a mim e eu que vou deixando as fichas caírem aos poucos. Registrei em foto e texto a ficha final caindo, em uma quarta-feira de céu e ar rosa neon:
"No fim de um dia difícil, fui tomar banho na mesma hora que o sol se punha. Como míope, o banho é uma experiência sensorial alternativa e naturalmente minha visão deixa de focar em formas e passo a prestar atenção nas cores. Só me dei conta disso recentemente, quando acompanhei a mudança do céu azul para o cor-de-rosa por de trás do vidro do banheiro, que também era míope. E assim curti o pôr-do-sol de gelatina. Talvez a dupla visão embaçada destacasse mais a cena de luz difusa e magenta. Ouso dizer também que esse pôr-do-sol pode ser mais bonito pelas frestas. A cor se intensificava e consegui me arrumar a tempo de ir na sacada observar o cenário amplificado. Me pareceu perder a magia. Não era só rosa, mas uma paisagem aberta e complexa. O pequeno enquadramento da janela do banheiro exagerava o aspecto neon da cor.
Os pores do sol de gelatina rosa são meus favoritos, prefiro eles aos espetáculos alaranjados no céu. Sinto que essa luz magenta está no ar, um ectoplasma do pôr do sol que encosta em nós, humanos imersos em oxigênio tingido, capazes de respirar o pôr do sol para dentro dos nossos pulmões. Esse espetáculo desce do palco, vem para a plateia. Ele manda em nosso tempo, muda em frente aos nossos olhos. Brincamos de entender em que momento a paleta de cores atinge seu auge. Em um minuto tudo muda e fica mais intenso. Em dois minutos tudo acaba.
"Eu acredito em fins de dia rosa." A frase veio a minha cabeça, me soou cafona e mesmo assim fiquei com ela. Acredito em quê? Seria essa luz diluída em rosa uma entidade? Ou uma verdade dita?"

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