Sentei no pé de uma laranjeira não muito alta, mas sempre carregada. Gostei de pensar que adubei frutos alaranjados, redondos, suculentos e vitaminados. Pousou um sabiá no miolo dos galhos. Achei legal, gordinho e de barriga alaranjada, combinou.
Sabiá é com certeza o pássaro que mais vejo. Acredito que nosso olhar até acostuma com sua presença, não tem cores vibrantes. Criei uma relação legal com a espécie quando li que foi escolhida como a ave símbolo do Brasil, mas que não foi decisão fácil. Houve muita resistência, já que a ave não possuía as cores da bandeira, ao contrário de outras espécies concorrentes. Mas enfim ele ganhou, e o legal do sabiá é que mais do que cores, ele fala de símbolos: é oficialmente pássaro mais citado por nossos poetas e músicos. Através de nós brasileiros, os sabiás sentem, choram, cantam, voam, pousam, são.
Tenho gostado cada vez mais da figura de pássaros, mas não simplesmente pela sua habilidade de voar. A imagem que mais gosto é quando estão pousados em árvores. É lindo, pacífico e reparo que pássaros enquanto pousados são muito observadores. Imagino que tenham pontos de vistas muito legais das entranhas das árvores, daquele emaranhado todo. Gosto mesmo é desse acesso alternativo às árvores: primeiro elas tem copa e depois, talvez, tronco. Nós humanos agarrados à terra, começamos a desenhar árvores pelo tronco.
Essa reflexão me fez lembrar de quando conheci o maior cajueiro do mundo, em maio de 2019, no Rio Grande do Norte. Por ser um ponto turístico comum e excessivamente fotografado, não botei expectativas quando soube que iria conhecê-lo. Mas caminhar pelas suas entranhas me comoveu, me senti imersa em seu universo. Escrevi no dia esse trecho:
“Os galhos quando tocam o chão, não apodrecem, mas criam raízes: de uma árvore central nascem outras, visivelmente ligadas ao mesmo sistema. Por onde você olha, está cercada da mesma estrutura. Cada galho tem sua própria forma, cada galho tem sua direção. Muitos se cruzam, outros nunca vão se encostar, mas todos têm a mesma origem e nela permanecem conectados. Todos buscam o sol.”
Tudo em volta era conectado a mesma estrutura, vários ângulos, várias raízes. Entrei, permaneci e saí com o respeito natural e espontâneo de um lugar sagrado. Era enorme e acolhedor. Queria criar minhas raízes ali também. E hoje, revisitando essa lembrança, imagino que essa seja a visão dos sabiás nas laranjeiras, paineiras, araçás, araucárias. Cada árvore pousada eles mergulham em um universo particular. Cada vôo eles lembram do todo.
Subi na estrutura que permite ver a extensão do cajueiro, realmente estonteante. Mas subi já sentindo saudade do que conheci no seu interior. Imagina só como seria visitá-la em épocas de caju, baita fruta linda, dizem que são quilos e quilos diários recolhidos. Baita árvore generosa, nutrida. Obrigada língua portuguesa por me apresentar às árvores como substantivo feminino.
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